O Futuro do Governo Bolsonaro: Pandemia + Crise Econômica + Crise Política
Por Andrea Gozetto*
Sob a moderação precisa de Bruno Perman, presidente do IrelGov e em meio a citações aos clássicos da política, como Alexis de Tocqueville e Max Weber, os convidados para esse instigante debate, Leonardo Barreto, Diretor da Vector Análise, e Suelma Rosa, Diretora de Relações Governamentais da Dow Química, discutiram o futuro do governo Bolsonaro em alto estilo. Em seu ápice de audiência, o Webinar contou com a participação de 70 profissionais de RIG que enviaram comentários e perguntas, tornando o evento bastante dinâmico.
Em sua fala inicial, Leonardo Barreto discorreu sobre o clima de instabilidade institucional que atravessamos. Alguns elementos importantes foram enfocados, entre eles a aproximação do presidente Bolsonaro do Centrão e uma possível desintegração da Câmara dos Deputados. No epicentro desse movimento, Leonardo destacou a articulação política decorrente da sucessão de Rodrigo Maia à presidência da Casa. Esse cenário, além de gerar a divisão do Centrão, o leva a criar novas estruturas de poder de convencimento junto aos parlamentares, disse.
Ressaltou que Bolsonaro está muito fragilizado, mas que ainda detêm o acesso a muitos recursos. Segundo Leonardo, o presidente tem força suficiente para permanecer no poder, mas talvez não tenha força suficiente para governar. Dessa forma, a agenda do governo continuará sendo determinada pela presidência da Câmara dos Deputados, que pode decidir se acolhe os pedidos de impeachment de Bolsonaro ou não.
Para Leonardo, a imprevisibilidade do Presidente é o grande elemento de perturbação das relações políticas no Brasil. Por isso, traçar cenários, hoje, se assemelha a dirigir em uma estrada tomada pela neblina. Quanto mais luz tentamos jogar sobre a neblina, menos conseguimos enxergar.
Ao iniciar sua fala, Suelma Rosa pediu licença para retroagir um pouco na história e buscou analisar a raiz das três crises sobrepostas que enfrentamos atualmente. Apesar da pandemia gerada pela Covid-19 não ser a maior da história, é a que nossa geração está vivendo agora. No âmbito político, a pandemia não cria nada novo, mas intensifica todos os problemas já conhecidos de nossa República: há uma clara dificuldade de coordenação do Poder Executivo, o Pacto Federativo mostra suas falhas, o déficit fiscal e a falta de recursos estão mais presentes do que nunca.
A crise econômica gerada pela pandemia nos acomete em um momento em que ainda estávamos tentando nos recuperar da crise de 2008 e da crise gerada pelo impeachment de Dilma Roussef, ocorrido em 2016. Segundo Suelma, os números de nossa economia são assustadores e as cenarizações são diversas, além de mudarem a todo momento. Enquanto discutimos as necessárias medidas protetivas aos cidadãos e às empresas, fomos brindados com o recrudescimento de uma instabilidade institucional, que se reflete na dicotomia entre os poderes Executivo e Legislativo, da falta de coordenação entre os entes federados e da ruptura de um apoiador importante do governo, o ex-Ministro Sérgio Moro.
O isolamento social torna mais difícil que a crise política se materialize, pois não podemos sair as ruas. No entanto, se passos mais concretos forem dados, esse cenário poderá mudar, haja vista a possibilidade das investigações das denúncias de Sérgio Moro avançarem, do Congresso aceitar os inúmeros pedidos de impeachment e de instalação de CPMI´s. O que está claro é que não temos condições de acomodar uma crise adicional, pois não solucionamos as duas crises em curso, afirmou Suelma. Segundo a convidada, consideradas todas as implicações legais e políticas decorrentes das denúncias de Sérgio Moro, já temos mais problemas do que somos capazes de resolver.
Leonardo, retomando a sua análise do nosso cenário político, ressaltou que Bolsonaro faz uma democracia plebiscitária e que está apostando no programa de transferência de renda, que ele apelidou de “Corona Voucher”, como uma ferramenta para apropriar-se do eleitorado que tradicionalmente pertencia ao PT, o que perfaz 40% da população brasileira. Citou dados muito interessantes de uma pesquisa realizada pelo Data Poder. Essa pesquisa demonstra que 77% dos entrevistados de menor renda afirmaram ter melhorado o aumento de disponibilidade de remédios e alimentos. Nesse estrato, a popularidade de Bolsonaro é de 40%. Por outro lado, sua popularidade junto à classe média é de apenas 20 %.
Em tom sombrio, afirmou que das nove crises econômicas ocorridas nas últimas décadas, em apenas uma delas, aquele que detinha o poder lá se manteve. Ele se referiu à FHC e a crise de 1998. Bolsonaro sobreviverá à crise gerada pela pandemia?
SDR e a atividade de RIG
A partir desse momento do evento, a audiência passou a participar ativamente. A primeira pergunta endereçada aos convidados se referiu aos impactos do Sistema de Deliberação Remota na atividade de RIG, haja vista que construir pautas e defender os interesses de clientes ficou muito mais difícil.
Para Leonardo, falta controle ao que os parlamentares estão votando. Além disso, ressaltou que se trata da primeira vez em ambiente democrático que um presidente decidiu não montar uma base parlamentar e da primeira vez que o parlamento delibera de forma remota. Essa situação reforça a necessidade da política. O sistema democrático fica fraturado quando não é possível negociar com os deputados para formar uma base de apoio a determinada agenda, quando não há canais de interlocução que garantam, sobretudo, o diálogo.
Ao responder à pergunta da audiência, Suelma afirmou que o fato de o Parlamento Brasileiro ser o primeiro do mundo a funcionar a partir de um sistema de deliberação remota ilustra o nosso caminho parlamentarista. Ressaltou que a necessidade de manter um Congresso em funcionamento reflete a fragilidade do nosso Presidencialismo ou de nossas instituições políticas. Suelma demonstrou sua preocupação com relação a forma como o processo legislativo foi adaptado ao SDR. Para ela, o ritmo está muito acelerado e os processos estão confusos. Ademais, processo legislativo apressado ou reduzido sem o devido debate, sem possiblidade de diálogo, é um grande risco à democracia. Para Suelma, o futuro da democracia será pela incorporação tecnológica. Porém, emendar a constituição nesse contexto é impensável.
SDR e Compliance
A convidada faz um questionamento extremamente relevante, principalmente para os profissionais de RIG que atuam em empresas privadas com programas de compliance consolidados. Como dar transparência ao diálogo com os tomadores de decisão realizados em Fóruns de liderança em grupos de WhatsApp? Quais as implicações legais dessas questões aos profissionais de RIG?
Cenários possíveis por Leonardo Barreto
Primeiro cenário: manutenção do presidente em uma situação semelhante à de Michel Temer após denúncias feitas pelo STF e recusadas pelos deputados. Bolsonaro teria força suficiente para se manter, mas não para governar. O centrão teria o presidente fragilizado e deve sugerir algum modelo de governança a partir dessa condição.
Esse cenário tem 60% de chances de ocorrer.
Segundo cenário: afastamento do presidente via STF. É mais rápido e com mais probabilidade de ser feito à distância, embora o Congresso dificilmente tenha condições de apreciar qualquer denúncia antes da crise do coronavírus ser vencida.
Essa alternativa tem 25% de chances de acontecer.
Terceiro cenário: impeachment. Menos provável em função da posição do centrão e da inviabilidade política de um funcionamento pleno do parlamento.
Confere-se a esse cenário 10% de chances.
Quarto cenário: A crise institucional está tão severa que, no momento, cada poder está trabalhando para assegurar a sua sustentabilidade. Caso o clamor popular se volte contra o Congresso com o aprofundamento da crise e seja necessário dar sobrevida ao sistema político em vigência, o Congresso poderá aprovar um fast track, ou seja, uma invenção institucional para avaliar o impeachment de Bolsonaro.
Esse cenário possui 5% de chances de ocorrência.
Como sair da crise
- Cadeia de comando clara;
- Centralização e coordenação;
- Autoridade aos gestores da crise para que planejem e implementem o plano de contingência, sem interferências;
- Unificação da comunicação;
- Plano de reestruturação econômica com foco em geração de empregos elaborado pelo Ministério da Economia e que conte com o apoio do Centrão para que reformas rápidas e profundas para dar sustentação ao plano sejam realizadas.
*Andréa Gozetto
Mestre em Sociologia Política pela Unesp, Doutora em Ciências Sociais pela Unicamp e Coordenadora Acadêmica do MBA em Relações Governamentais da FGV/SP.
O primeiro artigo do Webinar em Resumo, assinado por Andrea, trata do EPISÓDIO 1 da série de webinares semanais COVID-19: Os impactos nas Relações Governamentais, que contou com a participação da Diretora de Relações Governamentais da DOW e Vice-Presidente do IRelGov, SUELMA ROSA, o cientista político e Diretor da Vector Análise, LEONDARDO BARRETO, com mediação do Presidente do IRelGov e sócio do Perman Advogados, BRUNO PERMAN.
No WEBINAR EM RESUMO, profissionais associados ao IRelGov, com carreira acadêmica, partem do debate ocorrido em cada Webinar promovido pelo instituto para dissertarem sobre o tema de acordo com o viés que preferirem. Assim, o IRelGov cumpre sua missão como Think Tank, que pensa, analisa e compartilha ideias.